A Campanha “Agosto Lilás” é essencial na luta contra casos de violência contra a mulher.
Por: Carol
Meneses
Imagem da Campanha e Ilustração do Artista Alexsandro Palombro |
Em 2018 os casos de feminicídio cresceram
absurdamente no Brasil, e chocaram o país inteiro. Um desses exemplos foi o
caso da advogada Tatiane
Spitzner, 29 anos que foi jogada pelo marido Luis Felipe Manvailer, 32
anos, do 4º andar do
prédio onde moravam em Guarapuava, no Paraná. O que mais chocou o
Brasil foram as imagens da câmara de segurança do prédio que mostravam as
agressões físicas e verbais que Luis praticava contra Tatiane. Assim como foi o
caso da advogada, muitos relacionamentos abusivos e casos de violência
doméstica só são descobertos quando é tarde demais. Tatiane não foi a primeira
e, infelizmente, não será a última. De acordo com um levantamento feito
pelo G1, 12 mulheres são vítimas de
feminicídio diariamente no país.
Em consequência de casos absurdos como esse,
em 2017 foi oficialmente lançado o Agosto Lilás, uma campanha de combate à
violência contra a mulher que envolve secretarias municipais e estaduais e,
sobretudo, as escolas do país. O Brasil ocupa hoje o 5º lugar no mundo no
ranking de violência doméstica e, de acordo com dados do Conselho Nacional de
Justiça (CNJ), tramitam no Judiciário cerca de 900 mil processos sobre o tema,
sendo 10 mil deles sobre casos de feminicídio (crime de morte motivado pelo
fato da vítima ser mulher). Para entendermos um pouco mais sobre o assunto,
conversamos com a advogada e perita criminal Raphaela Souza, 31 anos, e com o
Mestre H.C em artes marciais e mestre de Kombato e Kali Silat, Richard David
Clarke Junior, 39 anos, que também é formado em Segurança Pública.
Ambos já ajudaram mulheres a se proteger
desses casos de violência. No caso de Richard foi ao ensinar defesa pessoal
para alunas que se depararam com violência, seja na rua ou em casa, e
conseguiram resolver, de forma inteligente, rápida e eficaz. Já no caso de
Raphaela a ajuda veio de medida protetiva expedida no Pará pela delegacia do Propaz
(especialista em atender a mulher que já sofreu ou ainda sofre violência
doméstica). Ela conta que teve uma história bem parecida com a de Tatiane Spitzner, já que sua cliente no
meio do caminho decidiu voltar com a pessoa, e após novas agressões resolveu
que bastava. Graças a esse basta, o problema foi resolvido com a prisão
do acusado, neste caso, sendo um dos poucos em que se conseguiu evitar a morte
de uma mulher por violência doméstica.
Tanto para a perita criminal quanto para o
mestre de Kombato, as redes sociais podem muito bem ser inimigas em casos como
esse. Isso porque os perfis desses sites acabam servindo como uma “capa” ou “
maquiagem”, mostrando apenas o que o casal queria mostrar, ou seja, o lado bom
da relação. A advogada acrescenta ainda: “Os
fatos até poderiam estar cercados de verdades nos momentos postados, mas diante
do que foi amplamente divulgado pela mídia é possível se dizer que as redes
sociais são meios que levam até mesmo a justiça a ser induzida a erro em um
julgamento, pois boas fotos, postagens que mostram que aquele momento foi uma
exceção podem acabar reforçando a tese de que uma pessoa possa sofrer de
problemas psicológicos que a levaram cometer alguma atrocidade contra a mulher.
”
Ambos concordam
que é possível reconhecer possíveis agressores, para isso é preciso reparar nas
atitudes costumeiras: ciúme possessivo, querer dominar tudo, a competitividade
com a companheira que nunca pode ser mais do que o companheiro e a
agressividade. Quanto à prevenção é bem simples, é só a mulher sempre se impor,
mostrar que ela tem seu respeito e seu valor, além de procurar o passado do seu
companheiro. Apesar de geralmente ser só depois de embarcar de cabeça que a
pessoa descobre, nesse caso a melhor maneira é se afastar de forma segura.
Lembrando que violência é todo ato que
atenta contra a integridade física, psicológica e sexual da mulher. Xingar e
ofender com palavras humilhantes caracterizam a violência psicológica, causando
um terror psicológico na mulher que passa a acreditar que ela é exatamente
aquilo que companheiro dizia. Sobre a
violência física é aquela atrelada ao porte físico da mulher, sendo as mãos,
braços, pernas. Que o homem utilizando força pode deixar sequelas como
hematomas, fraturas entre outras marcas no corpo da mulher como um todo.
Enquanto que a violência sexual está atrelada ao íntimo, se ampliando o
conceito desde uma relação forçada com o companheiro que a obriga a ter
relações, ou até a ameaça de se publicar fotos com nudez ou algo que a
comprometa.
Chegou a hora da divergência entre os dois,
isso porque para Richard a melhor forma de se defender é saber se defender,
estar preparada para qualquer tipo de violência, desde saber usar a sua força
ou saber usar o ambiente em que a cercava: “usar
o que tiver em mãos para equalizar, uma faca, caneta, lápis, cadeira etc, armas
próprias ou Impróprias, armas improvisadas. No Kombato o inimigo é o IVANS
(inimigo, volume, armado ou número e surpresa) baseado nisto que sempre estará
em "desvantagem", acrescenta o mestre de Kombato. Enquanto que
para Raphaela o primeiro passo é fazer o registro da ocorrência nas delegacias
especializadas em cada estado brasileiro. Alguns estados não aderiram ao Propaz.
Com a denúncia formalizada, a mulher é encaminhada para realizar o exame
pericial que atesta se houve de fato agressão contra ela. Isso acontece pois há
inúmeros casos de falsas denúncias, mulheres que recorrem ao Propaz com a
intenção de prejudicar seu companheiro ou ex-companheiro também. Por essa razão
todas passam por perícia, e quando a agressão e/ou ameaça é comprovada, a
mulher recebe medida protetiva, para lhe resguardar até a decisão final do
processo
Richard Clarke em palestra na Campanha( Foto:Facebook) |
De acordo com Richard Clarke, os golpes de Kombato mais indicados para
utilizar nos casos de violência variam para cada tipo de agressão, puxão
de cabelo, etc. Para ele o que faltou foi ela tentar evadir. E por esse motivo
ele deixou o seguinte recado: “Estejam
preparadas! Saibam escolher seus parceiros direito, analisem, perguntem,
estudem! Treinem de preferência Kombato! Porque não interessa a lei em vigor só
vai servir se você falhar! Esteja pronta para sobreviver. ”
Outro exemplo que marcou no caso da Tatiane
Spitzer era o fato dela ser advogada, e muita gente achou estranho como uma
advogada que sabe tanto sobre as leis deixa isso acontecer? De acordo com
Raphaela, não importa nem o status e nem a profissão que ela exerce, mas sim a
fragilidade após a agressão e a ameaça imperarem na vida dela. Talvez ela não
acreditasse que o companheiro chegaria as vias de fato e ceifaria a vida dela,
mas acabou deixando o medo prevalecer, já que como advogada ela deveria saber
que muitos processos de violência doméstica são protocolados por dia, porém
quase nenhum chega a ser concluído, porque antes do seu término as mulheres
eram brutalmente assassinadas. E por esse motivo ela deixou o seguinte recado: “Mulheres não tenham medo de lutar por
respeito e igualdade. Não temam em denunciar. Existe uma sociedade que protege
muito maior que um indivíduo que agride. ”
Raphaela Souza trabalhando na OAB-PA( Foto: Facebook) |